16 de dez. de 2013

Carta de um soldado só...

Há alguns anos foi achada em alguma parte da história, uma carta, um fragmento de memória escrito por um soldado, um pouco do que ele era, e do que se tornou...

"Olá, sou eu novamente, não sei por que sempre te escrevo, acho que é porque não tenho para quem escrever, talvez pela esperança de que você nunca se esqueça de quem eu fui, e não deixe eu me perder novamente, não sei se eu você já conseguiu me livrar dessa trincheira, mas espero algum dia ter coragem para sair dela, mesmo correndo o risco de ser alvejado e me machucar, dizem que tem toma essa atitude, nunca morreu, pois a coragem o manteve vivo e o levou para uma nova vida.

Eu era um soldado, na verdade, acho que sempre fui um soldado, por muito tempo defendi uma pátria, algo que eu achava correto, mas por interesses políticos, ela se vendeu e me mostrou que não há mais pátria, apenas jogos de estratégias para arrebanhar mais soldados em prol de sua pseudo causa. Desde então eu saí, sem capacete, nem baioneta, apenas minha bota e minha camisa branca meio surrada de tantas batalhas.

Resolvi sair da trincheira pela primeira vez, foi dolorido, tive que correr sem olhar em volta para não me apavorar, fragmentos de balas e estilhaços de bombas me atingiam por todos os lados, até que uma explosão fez com que eu perdesse o meu chão, ficasse surdo para o mundo ao meu redor, desnorteado e cambaleado. Consegui um buraco em meio a raiz de uma árvore para me abrigar até que conseguisse me nortear e entender o que estava acontecendo após aquela explosão.

Fiquei alí por muitos dias, até que sem saber como, tomei uma decisão e decidi continuar andando, fazer meu próprio caminho, sem pátria, sem tampa, sem bandeira nem medo busquei novos caminhos, me reergui, me repensei, me reorganizei, e me transformei no homem que eu queria ser, sim, um homem, não mais um soldado...

Foi então que atravessei fronteiras, enfrentei minhas limitações e medos, fui para a estrada sem rumo, mas com um norte, conheci povos e pessoas, e com eles me conhecia um pouco mais, descobri lugares, e mesmo passando apuros em lugares inóspitos, eu me alegrava, pois eu era livre, sem pátria nem exército, sem baioneta nem capacete. Dessa forma eu entendi os dois lados da guerra, e apesar de ainda acreditar no que eu defendia, aprendi a ser mais tolerante e respeitar aquele que diziam ser meu inimigo, pois aprendi que inimigo é um definição inerente ao lado que você enxerga uma guerra.

Conheci pessoas, aprendi muitas coisas com elas, me especializei em coisas que nem sabia que existiam, armas muito mais poderosas do que a baioneta que empunhei por tanto tempo. Vi o sol nascer em meio a pássaros enormes, e se por entre a majestade de um vulcão, fui do lugar mais inóspito ao mais badalado, fui sem rumo, sem preocupações, sem peso, sem baioneta nem capacete.

Nesse tempo eu caminhei feliz, mesmo tendo uma jornada dura, sem muitas coisas certas, atravessando vales e escalando montanhas, mas mesmo sem rumo e perdido, eu não me importava, pois eu havia me encontrado em meio a tudo aquilo. Criei meus conceitos e determinei algumas certezas temporárias, fiz o meu tempo. Não pensava em me fixar em lugar algum, não tinha planos, pois sabia que a falta de planos é que tinha me levado em segurança até onde eu estava. 

Apesar de que não querer empunhar uma baioneta novamente, sentia falta de sua companhia em minhas jornadas, mas sabia que com o peso dela em meus ombros, não teria conseguido fazer nem metade do caminho que fiz até alí. Porém, eu queria acreditar que um dia eu encontraria uma baioneta leve o bastante para me acompanhar pelas trilhas de maneira tranquila e confortável.

De repente, me deparei com um exército que me ofereceu paz e tranquilidade. Não sabia muito bem o que era, para onde ele me levaria, mas ví que era tranquilo, pelo que eu entendí a guerra havia acabado, por isso estava tudo tão tranquilo. Fiquei por um tempo para ver o que sairia daquilo para mim, até que sem presunção alguma, achei uma baioneta mais moderna e sem faca na ponta, nunca havia visto algo assim. Resolvi empunhá-la e ví que era muito mais leve do que a que eu usava antes, na hora eu me apaixonei por ela a ponto de nem prestar atenção num "bilhete" talhado em seu corpo de madeira que alertava para sua periculosidade ao que a usasse. 

Todos que já a conhecia, me alertava para os defeitos de disparo da arma, o desvio da mira, o coice forte o suficiente para deslocar o ombro de quem a empunhasse errado, fora seu barulho ensurdecedor. Porém, estava tão empolgado com sua agilidade e leveza que decidí não relevar esses avisos.

Muito tempo se passou desde então, a guerra que havia acabado recomeçou, porém dessa vez muito mais forte e armada, o inimigo era o mesmo porém mais furioso, o que fazia com que meu superior exigisse mais de mim, e novamente me vi entricheirado em uma guerra. O lado o qual anteriormente me dava orgulho de servir, se vendeu da mesma forma que meu último exército. A calmaria aparente da qual eu desfrutava, era só um aviso da enorme tempestade que estava por vir, e o rifle que até então era apenas algo leve em meus ombros, começou a falhar como haviam me dito e em meio aquela guerra, ele se tornou tão pesado quanto a minha antiga baioneta.

Hoje estou aqui, me escrevendo essa carta, em meio a explosões e tiros, no meio da trincheira, com um rifle pesado, uma pátria da qual não me orgulho mais. Isso me tornou triste, meu stress de guerra está em nível elevado, e toda vez que coloco a cabeça para fora do me posto, consigo enxergar uma vida diferente no horizonte, mas para chegar lá é necessário tomar coragem para novamente sair da trincheira, enfrentar a dor dos tiros e estilhaços e correr sem olhar ao redor em busca de um abrigo em meio as raízes das árvores para se recuperar e voltar a ser que eu era.

Para finalizar meu caro amigo, eu espero que ao ler esta carta, você já tenha me tirado desta trincheira, me livrando dessa pátria e me fazendo ser quem eu era, quem eu queria ser, e não o que eu me tornei. Caso isso não tenha acontecido ainda, deixo minhas considerações: Não tenha medo de correr, deixe seu rifle de lado e corra em busca de sua vida, salve-se em quanto é tempo, não seja ingênuo a ponto de achar que é possível achar paz em um exército, não deixe de ser um soldado, mas não se isso te limitar a um rifle pesado e uma trincheira, corra, procure uma guerra que te favoreça, não tenha medo de desistir de tudo e começar algo do zero.

Lembre-se de que até hoje, ninguém morreu por sair da trincheira, pois a sua coragem o leva em segurança, por um caminho doloroso e perigoso, mas que fim te leva a quem você realmente é."

Um comentário:

Olá, aqui é o cabeludo, após o sinal deixe seu recado, que logo mais eu vou ler, prometo! rs